O que é o imposto mínimo global?
O imposto mínimo global surge de uma competição entre países para atrair investimentos estrangeiros com incentivos fiscais e alíquotas reduzidas de imposto de renda corporativo, o que gerou, ao longo das últimas décadas, um cenário conhecido como “race to the bottom” — ou “corrida para o fundo”. Nessa realidade, as nações concorrem entre si oferecendo tributações cada vez menores para sediar multinacionais, muitas vezes em detrimento da própria arrecadação.
Diante disso, a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) estruturou o Pilar 2 do projeto BEPS (Base Erosion and Profit Shifting). Sua finalidade? Estabelecer um imposto mínimo global sobre os lucros de grandes multinacionais.
Neste artigo, explicaremos com detalhes do que se trata esse imposto, por que ele surgiu e como o Brasil se encontra nesse cenário.
O que é GloBE?
O Pilar 2, também chamado de Global Anti-Base Erosion Rules (GloBE), propõe a aplicação de uma alíquota mínima global de 15% sobre os lucros de grupos multinacionais. Mesmo que parte dessas operações estejam em países com tributação favorecida, o restante da alíquota (chamada de top-up tax) deverá ser recolhido em outras jurisdições onde o grupo atue.
A lógica é essa: garantir que nenhuma subsidiária escape da tributação mínima, transferindo a responsabilidade pelo recolhimento do imposto para outras unidades do grupo, caso o país onde ela está não o faça.
Por que surgiu o imposto mínimo global?
Essa proposta não surgiu por acaso. Alguns interesses mobilizaram os países do G20 para acelerar a implementação desse imposto. São três grandes catalisadores que impulsionaram a agenda internacional:
- Modelos norte-americanos de taxação mínima, como o GILTI (Global Intangible Low-Taxed Income), criado em 2017, e o CAMT (Corporate Alternative Minimum Tax), em 2022, influenciaram diretamente o escopo técnico do Pilar 2. Ambos eram espécies de imposto mínimo com alíquotas de 21% e 15%, respectivamente, sobre os lucros e a renda – de modo geral.
- A pandemia de Covid-19, uma das maiores emergências de saúde da história, provocou um expressivo aumento da dívida pública global e levou os países a intensificarem a busca por soluções para proteger e ampliar suas bases tributárias.
- A constatação de que medidas anteriores da própria OCDE, como as CFC Rules, não foram suficientes para conter estruturas que drenam lucros para paraísos fiscais.
Como funciona o imposto mínimo global na prática?
A aplicação do GloBE depende de duas regras principais:
- Income Inclusion Rule (IIR): se uma subsidiária de multinacional for tributada abaixo de 15% em determinado país, o país de origem da controladora (empresa-mãe) pode recolher a diferença, desde que tenha implementado a IIR.
- Undertaxed Payments Rule (UTPR): caso a controladora esteja sediada em país que não adote a IIR, outra jurisdição do grupo pode cobrar a diferença de imposto, ajustando a dedutibilidade de despesas ou base de cálculo.
Imagine que uma multinacional brasileira tenha uma subsidiária nas Bahamas (com zero de imposto de renda) e outra na Itália. Caso o Brasil não adote a IIR, mas a Itália sim, a subsidiária italiana poderá ser obrigada a recolher o imposto complementar referente à unidade das Bahamas.
Dessa forma, o imposto mínimo global funciona como um mecanismo de compensação fiscal, garantindo que os lucros de multinacionais sejam tributados de forma adequada — ainda que parte de suas operações esteja localizada em jurisdições com baixa ou nenhuma tributação, como paraísos fiscais.
Desafios para implementação do GloBE
Apesar de aparentar ser algo simples conceitualmente, a implementação do imposto mínimo global traz diversos desafios que dificultam sua adoção prática por diferentes países.
Um dos principais entraves está na harmonização contábil. A base do Pilar 2 está nas demonstrações financeiras internacionais (IFRS), mas nem todos os países adotam esse padrão. Índia e Vietnã, por exemplo, sequer permitem sua utilização. Isso dificulta a aplicação uniforme da alíquota efetiva de imposto entre diferentes jurisdições, comprometendo a consistência do modelo.
Além disso, o desenho do imposto proposto pela OCDE é tecnicamente complexo. As regras exigem fórmulas detalhadas para o cálculo de lucros excedentes, impostos ajustados e deduções específicas. O cálculo da alíquota efetiva demanda uma série de ajustes contábeis e projeções baseadas no IFRS, o que pode gerar insegurança jurídica e operacional, especialmente em países com menor estrutura técnica.
Outro desafio relevante é a compatibilidade do imposto mínimo com os incentivos fiscais internos de cada país. Muitas nações oferecem benefícios regionais com alíquotas inferiores a 15%, como é o caso da Zona Franca de Manaus no Brasil ou da Zona Franca da Madeira em Portugal. Em muitos casos, esses benefícios são respaldados por normas constitucionais ou tratados regionais, o que impõe limites à capacidade dos governos de ajustarem sua política tributária.
Brasil e o imposto mínimo global
Atualmente, o Brasil ainda avalia a melhor forma de aderir ao Pilar 2. A adoção de uma Income Inclusion Rule (IIR) dependerá de reformas legislativas internas e da compatibilidade com os incentivos hoje em vigor. Uma alternativa menos invasiva seria a implementação do QDMTT, permitindo que o próprio país arrecade a diferença sem abrir mão dos benefícios locais.
A Reforma Tributária ainda pode abrir caminhos para a adoção do Pilar 2. A substituição de tributos como PIS, COFINS, ICMS e ISS por um modelo dual de IVA (IBS e CBS) tende a aproximar o sistema brasileiro dos padrões internacionais, simplificando a base de cálculo e a apuração de tributos — fatores essenciais para compatibilidade com as regras do GloBE.
Dessa forma, torna-se possível comparar a alíquota padrão do IVA brasileiro com a de outras economias que já adotam esse modelo em seus sistemas tributários. Essa análise permite avaliar, em termos práticos, uma espécie de “imposto mínimo efetivo” com base nas alíquotas aplicadas por países que operam sob o regime de Imposto sobre Valor Agregado.
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